No Brasil, até o passado é incerto

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Se há algo que insiste em faltar no Brasil é a segurança jurídica. A recente decisão monocrática do Ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, que anulou as condenações do ex-presidente Lula na Lava Jato com base na suposta incompetência da Vara Federal de Curitiba, escancarou o grau de fragilidade institucional em que o país mergulhou.

Não se trata apenas de uma interpretação processual, trata-se de um abalo sísmico na estrutura da justiça, da política e da confiança internacional no Brasil.

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O impacto institucional das decisões monocráticas

Em uma república democrática, decisões judiciais devem preservar o equilíbrio entre os poderes e o respeito às instâncias recursais.

No entanto, decisões monocráticas, ou seja, tomadas por apenas um ministro da Corte, têm se tornado instrumentos de concentração de poder que driblam o colegiado e, em muitos casos, produzem efeitos imediatos de alcance nacional.

No caso Fachin, não apenas um processo foi anulado: desconsiderou-se todo o esforço da maior operação anticorrupção da história recente do país, ferindo gravemente a moralidade pública.

A multiplicação de decisões individuais no STF vem, há anos, ampliando a instabilidade jurídica. Elas geram jurisprudências confusas, criam precedentes frágeis e enfraquecem a autoridade das demais instâncias, desde o Judiciário de primeira instância até os Tribunais Superiores.

Para investidores, empresários e cidadãos comuns, isso significa incerteza sobre regras, contratos e até mesmo direitos adquiridos.

Efeitos políticos e econômicos: a insegurança como norma

A decisão que devolveu a elegibilidade a Lula, poucos meses antes do início formal do processo eleitoral, alterou profundamente o tabuleiro político nacional.

O gesto, vindo de um membro da Suprema Corte, teve repercussão imediata não só na classe política, mas também na economia: o dólar disparou, a bolsa caiu e as expectativas de estabilidade institucional retrocederam anos.

O Brasil vive, desde 2013, ciclos de tensão política e crises econômicas entrelaçadas. O que diferencia o atual momento é o acúmulo de desconfiança: uma pandemia mal administrada, um Estado inchado e ineficiente, e um Judiciário que age por cima das leis ou as ressignifica conforme interesses circunstanciais.

Nesse contexto, decisões judiciais deixam de ser técnicas e passam a ter consequências políticas e financeiras diretas. Isso afugenta investimentos de longo prazo, paralisa reformas estruturais e isola o país no cenário global.

Liberalismo e a centralidade da segurança jurídica

Para o liberalismo clássico, a segurança jurídica é pilar fundamental de uma sociedade livre e próspera. Sem segurança jurídica, não há contratos duradouros, não há liberdade econômica verdadeira, e tampouco se preserva o império da lei.

Um país que muda suas regras conforme os ventos políticos, ou conforme o gabinete de um ministro específico, está fadado à estagnação. 

A ausência de estabilidade normativa inibe a inovação, deteriora a confiança no Estado e transforma o Judiciário em ferramenta de dominação e não de justiça.

O ciclo vicioso da instabilidade

A decisão de Fachin não foi a primeira, e será dificilmente a última, a fragilizar a confiança nas instituições.

O problema é que, uma vez instaurado esse modelo de ativismo judicial seletivo, o país entra em um ciclo vicioso: cada governo tenta controlar a máquina do Judiciário, que por sua vez se protege com decisões que blindam seus próprios membros, e a população se vê cada vez mais distante dos centros decisórios.

O sistema torna-se refém de interesses particulares, e não da vontade popular ou da legalidade.

Nesse cenário, até o passado se torna instável, porque decisões que antes pareciam definitivas são anuladas ou reescritas por conveniência.

O que está em jogo

Mais do que um nome na cédula eleitoral, o que está em jogo é a confiança nas instituições e na lógica da separação de poderes. 

A Procuradoria-Geral da República chegou a protocolar pedido de revisão da decisão, mas o estrago já estava feito. 

O Judiciário, ao agir com parcialidade e sob os holofotes, transforma-se em protagonista político e deixa de ser guardião da Constituição.

Se o Brasil quiser reconstruir sua estabilidade, atrair investimentos e dar dignidade à população, precisa resgatar urgentemente o valor da segurança jurídica. 

Isso exige coragem institucional, limites claros ao poder dos ministros e um compromisso autêntico com a lei como instrumento de justiça, e não de poder.

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Mateus Vitoria Oliveira

CEO Private Construtora, Private Log e Private Oil & Gas
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